domingo, 25 de novembro de 2018

Sobre polegares para baixo..."pollice verso"

         Na Roma antiga, o Coliseu abrigou as batalhas sangrentas dos gladiadores, os cristãos (ou qualquer inimigo em potencial de Roma) lançados aos leões para divertir a turba, espetáculos ‘culturais e sociais’ regados à violência e ao entretenimento. O ponto alto do evento era ao fim da luta, o guerreiro vencido no chão, rendido pelo seu rival que aguardava de pé o ‘decreto’ do César, o ‘pollice verso’, o polegar virado, o polegar para baixo, decidindo pela morte do ‘derrotado’...
         Talvez os Césares tenham criado, sem imaginar, o ‘like ou dislike’ usados hoje nas redes sociais. Parece-me que hoje em dia, como se estivéssemos num imenso ‘coliseu’, cheios de pseudo césares, autonomeados, onde pessoas fazem de tudo para alcançarem alguns likes, fingem, dissimulam e editam a própria existência, numa grande fogueira das vaidades, onde sentamos em nossos tronos e ‘decidimos’ o que é bom e o que não é bom. O que é ou não belo. Dirimindo o que serve ou não, o que é digno ou não...

         Ignorando realidades e verdades, indiferentes ao esforço exaustivo de anos por filósofos e estudiosos que se dedicaram a definir o bom, entender o que é a felicidade, sem no entanto arrogarem para si qualquer êxito.  Pessoas sem expressão, sem simpatia ou conteúdo se assentam diante ‘do mundo’ para decidir o que ou quem presta ou não, mas que são capazes de qualquer atividade no mundo real. Dão receitas infalíveis, ensinam e julgam o seu semelhante sem medo, temor e por vezes até sem respeito algum...
         Pais querem ensinar filhos e filhas com posts, mandam ‘mensagem’ através de publicações, mas são incapazes de sentarem com os mesmos, olhar nos olhos e conversar sobre o que for preciso. Pessoas ‘oram’, ‘evangelizam’, ‘doutrinam’ e ‘divulgam correntes de ajuda’ para Deus e todo mundo, mas são incapazes de no mundo real elevar um pensamento de bondade ao próximo, uma atitude, uma palavra amiga ou ajudar de fato quem quer que seja...
         Enquanto sonhos são jogados aos leões, césares modernos julgam a vida de todos num mundo individualizado e mesquinho, criado com fotos editadas e ‘relacionamentos sérios’ que parecem piadas, mas que não tem receio de sentenciar seus semelhantes de forma impiedosa.

         Que o nosso olhar consiga ver a vida também através dos olhos daquele que está caído, derrotado, vencido pela vida e que busca com esperança a misericórdia daqueles que se assentam nos tronos da vida e que precisa, além de um polegar para cima, uma mão estendida e um braço que o sustente, para que possa se erguer uma vez mais...


quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Ativismo de perfil ou sobre a próxima #


            Ultimamente tenho preferido ficar em silêncio sobre diversas questões, não por não haver o que dizer, mas sim pela sensação de que não adianta refletir. Temos visto um tal ponto de extremismo polarizado que de nada serviria falar ou escrever qualquer coisa.
         Pode até parecer omissão, mas está mais para um preferir a paz. Vi um ‘post’ outro dia que dizia que as pessoas não querem a sua opinião, o que elas querem é ouvir a opinião delas saindo da sua boca...

         E este é o ponto, há hoje uma total inaptidão para o debate, pois preferem o embate. Há um não querer ouvir, compreender ou refletir. Fazem alguns anos que tenho me reconstruído constantemente, me permito rever conceitos, se preciso volto atrás, peço desculpas, mudo a direção ou recomeço. Mas percebo uma crescente onde de infantilização, pois as pessoas não amadurecem mais, são intransigentes e obstinadas. Tomam ‘suas verdades’ como verdades absolutas e acreditam no que querem, mas isto não basta, é preciso ‘catequizar’ outros e o respeito ao diferente é cada dia mais distante...
         Os segmentários se multiplicam e o fracionamento da sociedade se torna fundamentalista e polarizado, incapacitando qualquer diálogo entre contrários, compreendendo-se tudo como oposição. Não há entendimento ou compreensão, e o pior é que nem mesmo há disposição para isto.
         Como se estivéssemos em franca regressão, andamos para trás, como se nos desassociássemos, fazendo o caminho oposto ao dos primórdios da construção das primeiras aldeias e cidades, onde a busca do bem comum fazia com que a humanidade buscasse a socialização. Na contramão da história, em pleno advento das redes sociais, percebemos a nossa imaturidade para as mesmas. Como se não estivéssemos prontos para as redes sociais, deixamos de lado o convívio social real pelo virtual. Então gente que nunca lutou por nada na ‘vida real’ se torna ativista engajado nas redes sociais, na facilidade da virtualidade em detrimento da luta real, na vida de fato, pelo bem de todos e não pelo seu conforto pessoal.
         Onde quem, como eu já fiz, ao fazer um ato público e movimentar estudantes em luta pela escola pública, fica olhando gente ‘lutando’ por uma causa diferente de acordo com o tema de perfil disponível, desde que o ‘wi-fi’ permita e não atrapalhe o horário da próxima série da Netflix...

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